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abril 25, 2004

o meu dia 25 de Abril de 74 

Vivo na Avenida 24 de Julho, com vista para o Tejo e para o mercado da Ribeira.

Como habitualmente, por volta das 8.00 horas, atravesso a avenida para apanhar o eléctrico 25, em direcção aos Prazeres, e vejo alguns jipes do Exército a passar, quase em câmara lenta.
Estranho, pensei!
Tlim, tlim, é o eléctrico. Fico na rectaguarda, e pelo vidro traseiro, observo, ainda sem perceber o Movimento.
Vejo então que um jovem soldado, que deve ir entrar de serviço no Hospital Militar da Estrela, olha com a mesma curiosidade que eu para a rua.
Passa então um enorme tanque em direcção ao Cais do Sodré, e aí perguntei ao soldado "o que é que anda aqui a fazer um tanque no meio da avenida?". "Sei lá?", respondeu ele, com a mesma surpresa. Grande nabo, devo ter pensado na altura. Se é militar, devia saber.

Estou no 1º ano do Curso Industrial dos Salesianos.
Na habitual reflexão matinal antes do início das aulas, ritual que leva as turmas alinhadas para dentro da igreja, o discurso que já conhecemos de cor e que o director, o padre Maurício, pronuncia todas as manhãs, é substituído por: "Houve um golpe de estado, e há ainda alguma confusão, por isso hoje é melhor irem para casa!"
Grande festa, não há aulas!
Claro, não há regresso de eléctrico, mas sim a pé. Jardim da Estrela com eles!

Chego a casa já perto do meio-dia. A dona Cândida, mãe galinha, pergunta aflita "onde é que andaste?"
A seguir ao almoço, com a promessa de não me afastar de casa e não ir para além do jardim, tenho de alimentar a curiosidade.

Subo a Rua das Flores, pois a Rua do Alecrim está num alvoroço, e, chegado ao largo Camões, parece que vem tudo abaixo, com o tremendo barulho dos tanques que sobem a Rua da Misericórdia em direcção ao Carmo.

Por aqui não! Passo entre as igrejas do Chiado - a Brasileira ainda não sonha com Pessoa, subo a Serpa Pinto e.. Pum! Pum!, tiros de espingardas!
Espera aí, que isto não é para mim!
Desato a correr rua abaixo e só paro no Cais do Sodré. Meio desiludido por não ver o epicentro da coisa, ainda com vontade de voltar lá, mas algo mais forte me leva de volta a casa.

Da minha janela, vejo barcos da Marinha fundeados no meio do rio.
Acompanho a Revolução pela rádio e pela televisão.
Lembro-me do Spínola, por causa do monóculo, e do Américo Tomaz, conhecido pelo corta-fitas.

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